Pecuária de leite no Brasil: algumas vantagens competitivas


Glauco Carvalho – Economista MSc, Pesquisador da Embrapa Gado de Leite –  glauco@cnpgl.embrapa.br

 

          

           A produção mundial de leite de vaca foi de 549,7 milhões de toneladas em 2006. Entre 2000 e 2006 a produção cresceu 2% ao ano e houve alteração na oferta, com alguns produtores perdendo participação de mercado, sobretudo membros da União Européia. Por outro lado, tem ocorrido incremento da oferta nos Estados Unidos, Índia, Nova Zelândia, Brasil e especialmente a China. 

 

E como suportar a expansão da produção? Para os próximos anos espera-se crescimento na demanda por alimentos na esteira do crescimento populacional, melhorias de renda e urbanização. Estudo da OCDE-FAO indicou que em 2006 havia no mundo cerca de 6,53 bilhões de habitantes, sendo esperados 7,27 bilhões de habitantes para 2016. No caso da renda, o crescimento anual médio projetado entre 2007 e 2016 é de 3,05%, o que supera o crescimento verificado nos últimos dez anos, de 2,86% ao ano. As maiores taxas de crescimento da renda devem ocorrer nas regiões mais populosas, como África, Ásia, América Latina e Caribe. Além disso, sabe-se que os países de renda mais baixa apresentam consumo de proteína animal relativamente menor que os desenvolvidos, ou seja, o crescimento de renda deverá impulsionar o consumo de produtos de origem animal nos países em desenvolvimento, justamente os mais populosos.


          Um exemplo desse movimento refere-se ao caso da China. Em 2000 o consumo per capita de grãos naquele país era de 82 kg, recuando para 77 kg em 2005. Por outro lado, o consumo de carne suína passou de 16,7 kg para 20,2 kg. O de carne bovina de 3,3 kg para 3,7 kg. No caso do leite, o consumo per capita saltou de 9,9 kg para 17,9 kg no mesmo período.


          E quem tem possibilidade de expandir a oferta? Ao nível atual de preços internacionais, vários países. No entanto, no patamar histórico de preços o Brasil certamente é um importante player.


          Um dos fatores mais importantes e que influencia na capacidade de produção de alimentos de um país é o potencial de terra arável (terra com possibilidade de cultivo, excluindo áreas de florestas e reservas). A tecnologia também faz diferença, ou seja, à medida que a tecnologia se torna mais avançada, pode-se obter maior volume de produção por meio de um determinado conjunto de insumos. No entanto, conforme a teoria econômica quando um fator de produção vai ficando mais escasso seu preço tende a subir. A competição pelo uso da terra por diferentes atividades, em especial a expansão da agroenergia, tende a incrementar seu valor afetando os custos de produção de leite. Isso, por sua vez leva a um processo de intensificação da atividade. Países com maior abundância de terras disponíveis, menor custo de produção total ou custo de suplementação alimentar tendem a ser mais competitivos.

Disponibilidade de terra


          A Terra tem uma superfície de 13.041 milhões de hectares (ha) dos quais 5.017 milhões são áreas agrícolas. A superfície agrícola possui 69,5% em pastagens e 30,5% em agricultura. Os quatorze países de maior produção de leite em 2006 (EUA, Índia, China, Rússia, Alemanha, Brasil, França, Reino Unido, Nova Zelândia, Ucrânia, Polônia, Itália, Holanda e Austrália), que responderam por 64% da oferta de leite, detêm aproximadamente 5.900 milhões de ha em área total de terra, sendo 1/4 considerado área potencial arável. Todavia, alguns países com grandes extensões de terra, como Austrália e Rússia, enfrentam problemas de degradação e contaminação do solo. Já países como Polônia, Ucrânia, Alemanha, França e Reino Unido apresentam mais da metade de seus territórios aptos a agricultura. No Brasil, cerca de 46% do território tem potencial arável. Em termos absolutos o Brasil é o detentor de maior área de terras potenciais aráveis, quase quatrocentos milhões de ha conforme Figura 1.


          No que tange as áreas com pastagens e áreas não utilizadas o Brasil possui cerca de 330 milhões de ha, ou seja, três vezes superior à existente nos Estados Unidos e Rússia, nove vezes superior a da Austrália e muito superior à dos demais países. Portanto, o Brasil possui boas vantagens comparativas para a expansão da agricultura e da pecuária de leite sem provocar grandes pressões em preços de terras e de alimentos/ração. Além disso, alguns dos países produtores de leite enfrentam dificuldades quanto a incorporação de tecnologias, clima e aumento progressivo da população. Os Estados Unidos, por exemplo, encontra dificuldade em ampliar sua produção via produtividade, pois a tecnologia existente já foi incorporada. A Índia e a Rússia, com grandes extensões, enfrentam limitações climáticas e geográficas. A China precisa alimentar um grande contingente de população, além da necessidade de investimentos em preparação de solos. Isso sem falar nas limitações quanto ao uso sustentável de água. Por fim, o preço da terra no Brasil é bem inferior ao de outros países. Na Nova Zelândia o hectare custa mais de 15 mil dólares e na Alemanha mais de 11 mil dólares.

 

                                Figura 1. Área agrícola, pastagens e áreas não utilizadas em países selecionados
 
 

Custo de produção


          O Brasil se destaca entre os países com menor custo de produção no mundo, ao lado da Índia, China e Ucrânia. Com custos ligeiramente acima aparecem Estados Unidos, Austrália, Polônia e Nova Zelândia. Por fim, no grupo de países com mais elevados, acima de US$ 0,35/litro, encontram-se vários países Europeus. Em alguns casos, a produção de leite chega a ser a atividade secundária, sendo mais importante ter a vaca no campo, segurar a família no meio rural, usar o animal como atração em turismo rural, etc.


          Um outro fator competitivo para o Brasil esta relacionado ao baixo custo de suplementação alimentar do rebanho. Isso ocorre, entre outros motivos, porque o país pratica um sistema de exploração à base de pastagens. Assim, o custo marginal de expansão da produção de leite no Brasil é relativamente menor que o de outros produtores mundiais como a Austrália, Nova Zelândia e França, que possuem sistemas mais otimizados e ração mais cara. A Figura 2 ilustra a competitividade no custo de suplementação além da disponibilidade de terras. Países como França, Nova Zelândia e China já não possuem tanta área disponível e incorrem em altos custos de suplementação do rebanho.
 

                              Figura 2. Disponibilidade de terras e custo de suplementação (2005) em países selecionados (2005)

 

 

Produtividade


          O aumento de produção de leite no Brasil ocorreu principalmente devido ao aumento da produtividade média. Entre 1990 e 2006 enquanto o número de vacas ordenhadas subiu 11,5%, a produção de leite aumentou nada menos que 77%. Ainda assim, o país ocupa uma posição mundial ruim no âmbito da produtividade, que é quase três vezes inferior a da Nova Zelândia e sete vezes menor que a dos Estados Unidos conforme Figura 3. Entre os maiores produtores mundiais o Brasil está à frente somente da Índia, em produtividade por vaca. Tal situação ilustra também o potencial de expansão da produtividade no Brasil, na esteira de melhoramento genético do rebanho, maior profissionalização na gestão das fazendas, melhorias no manejo e na nutrição das vacas.
 

 

                              Figura 3. Produtividade média em países selecionados (ton/vaca).

 

 

          Portanto, verifica-se que o Brasil possui vantagens competitivas na disponibilidade de terras para expansão da agricultura e pastagens, baixo custo de suplementação do rebanho e possibilidade de incorporação de tecnologias para incremento da produtividade. Por isso, o mundo olha para o Brasil agro e muitos investidores estão migrando para as terras tupiniquins. Todavia, apesar da disponibilidade de terras para se arar futuramente exige-se grandes investimentos em infra-estrutura, melhorias na regulação, fortalecimento da pesquisa e extensão rural, cuidados com aspectos sócio-ambientais entre outros desafios.

 

 

Esta é a edição nº 15 do informativo eletrônico, Panorama do Leite, de 30 de janeiro de 2008, uma publicação mensal de responsabilidade do Centro de Inteligência do Leite CILeite, criado em parceria entre a Embrapa Gado de Leite e a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais – Seapa. Embrapa Gado de Leite – Chefe-geral: Paulo do Carmo Martins, Chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento: Pedro Braga Arcuri, Chefe-adjunto de Comunicação e Negócios: Marne Sidney de Paula Moreira e Chefe-adjunto de Administração: Luiz Fernando Portugal Silva. Editora Geral: Rosangela Zoccal. Coordenador de Jornalismo: Rubens Neiva. Redação: equipe técnica do CILeite. Colaboração: Vanessa Maia A. de Magalhães. Projeto gráfico: Marcella Avila. Editoração eletrônica: Angela de Fátima A. Oliveira e Leonardo Fonseca. Estagiário: Milana Vidal Zamagno.

 

 

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