Concentração da produção mundial de leite

Glauco Carvalho – Economista MSc, Pesquisador da Embrapa Gado de Leite – glauco@cnpgl.embrapa.br

Sarah B. K. Vieira; Marcelo M. Duarte e Tayrine F. de A. Guimarães – Estudantes de economia das Faculdades Integradas Vianna Júnior e Universidade Federal de Juiz de Fora e bolsistas da Embrapa   Gado de Leite.

A produção de leite de vaca foi de 549,7 milhões de toneladas em 2006, registrando crescimento anual médio de 1,2% entre 1992 e 2006. Esse volume está distribuído por todo o mundo e a heterogeneidade do processo produtivo entre diferentes países é marcante. Países mais desenvolvidos ou com maior emprego de tecnologia, em geral, possuem produtividade mais elevada e maior escala de produção. Muitos desses países, notadamente os Europeus e os Estados Unidos contam com elevados subsídios, que vêm apresentando tendência declinante nos últimos anos (OCDE, 2005). Nos países em desenvolvimento a produtividade também vem se elevando, provocando maior contribuição para a oferta mundial. Nesse sentido verifica-se uma alteração geográfica na produção de leite e em sua concentração produtiva.

Entre 1992 e 2006 a Europa apresentou recuo de participação na oferta global, saindo de 51,20% para 38,10% (Figuras 1A e 1B). A América do Norte manteve participação estável, no patamar de 16,50% enquanto as outras regiões apresentaram incremento. Merece destaque a evolução registrada pela Ásia, que subiu de 16,00% para 24,41%. Nos países da América Latina e Caribe a participação na produção foi de 12,01% em 2006 ante 9,80% em 1992.   

     1992

2006

No âmbito da concentração da produção o mercado mundial de leite apresenta características de um segmento desconcentrado, medido pelo Índice de Hirschman-Herfindahl (HHI). Esse indicador apresenta três intervalos de orientação, sendo menor que 1.000 (baixa concentração), de 1.000 a 1.800 (concentração moderada) e maior que 1.800 (alta concentração). Em 2006 o HHI para a produção mundial de leite foi de apenas 478 ante 517 em 1992. Portanto, durante o período de 1992 até 2004 a concentração do setor seguiu uma tendência de queda, sempre com o aumento da produção de leite. Em 2004 o índice atingiu seu menor nível, de 464. Após este ano tanto a concentração quanto a produção se elevaram. (Figura 2).

Esse resultado de recuo na concentração da oferta global reflete uma alteração geográfica na produção de leite, com redução da produção da Europa (ainda principal região produtora) e incremento da produção de outras regiões do globo, notadamente alguns países asiáticos.

O recuo na oferta européia pode ser parcialmente atribuído às reformas políticas, que culminaram em diminuição gradativa de subsídios, e também por serem países com menor competitividade em custos de produção. Além disso, os países europeus estão entre os que apresentam os maiores níveis de produtividade média do rebanho, indicando um alto grau de incorporação de tecnologia e dificuldade de expansão marginal da oferta. A Rússia foi o país que mais contribuiu para a queda da participação européia, com produção recuando de 47,01 milhões de toneladas em 1992 para 31,07 milhões de toneladas em 2006, ou seja, queda de 15,9 milhões de toneladas (Tabela 1).

O principal recuo da produção nestes países europeus ocorreu de 1992 a 1998, estabilizando em seguida. Com o fim da antiga União Soviética, o setor lácteo na Rússia passou por um processo de reorganização e competição capitalista. Todas as ineficiências anteriormente mascaradas pelo regime comunista apareceram, exigindo do setor privado melhorias de qualidade, investimento em máquinas e equipamentos, qualificação de mão-de-obra, entre outros fatores. O reflexo imediato foi redução significativa do rebanho e queda da produção de leite. O mesmo movimento ocorreu na Ucrânia, que também contribuiu para a perda de participação européia na oferta global.

Por outro lado, a Ásia vem sistematicamente aumentando sua produção mundial de leite. Entre 1992 e 2006 a produção asiática subiu 82%, graças principalmente à expansão verificada na China e na Índia. Em 1996 a China era o vigésimo produtor mundial de leite de vaca, chegando à terceira posição em 2006. Nesse período, ocorreram grandes investimentos no setor com importação de vacas da Nova Zelândia e Austrália, transferência de embriões e melhorias no manejo. No caso da Índia, também se pode verificar um importante aumento de produtividade do rebanho, na esteira dos investimentos em melhoramento genético.

Concluindo, apesar do mercado de lácteos ser desconcentrado em termos de produção por país, movimentos de alteração na oferta foram encontrados e novos atores surgiram, ocupando espaços de importantes produtores como os Europeus. Por enquanto os países que mais se aproveitaram disso foram os asiáticos. Contudo, esse não é um movimento finalizado e países com maior competitividade, possibilidades de incorporação de tecnologia e estratégias definidas de inserção no mercado internacional vão aproveitar melhor os espaços no cenário global da indústria de alimentos.

Agradecimentos: à Fapemig que apoia e financia esta pesquisa.

Referências
FAO - FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS. FAOSTAT database, 2007. Disponível em <http://faostat.fao.org/>. Acesso em: 05 fevereiro 2008.
ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Agricultural policies in oecd countries: monitoring and evaluation 2005. 2005. Disponível em <http://www.oecd.org/newsEvents/0,2347,en_2649_33773_1_1_1_1_37 401,00.html>.