Mercado mundial de leite e produtos lácteos: visão da FAO


Glauco Carvalho  - Economista e pesquisador da Embrapa Gado de Leite - glauco@cnpgl.embrapa.br

 Tayrine Fernandes de Almeida Guimarães, Sarah Bartels Kirchmeyer Vieira e

Carmem Maria Oliveira Spaniol  - Estudantes de Economia do Instituto Vianna Júnior

e bolsistas da Embrapa Gado de Leite

          

Preços

Em meados de 2008 a Food and Agriculture Organization (FAO - Global Market Analysis) divulgou uma análise sobre o mercado mundial de leite e produtos lácteos. Nos próximos parágrafos segue uma síntese dos principais pontos abordados no relatório.

 

O índice de preços de produtos lácteos divulgado pela FAO em abril de 2008 foi 266, 12% menor se comparado a novembro de 2007 e 25% superior se comparado a abril de 2007. O produto que apresentou a maior queda foi o leite em pó desnatado, de aproximadamente 32% em relação ao pico de 2007. Esse recuo de preços na atual conjuntura reflete o aumento recente da produção mundial, sobretudo em países onde predomina os sistemas baseados em pastagens. Além disso, a elevação das cotações em 2007 estimulou o processo de intensificação da produção de leite. A Figura 1 ilustra o comportamento dos preços internacionais de produtos lácteos.

 

No entanto, existem algumas incertezas sobre a tendência de preços internacionais para os próximos meses, já que alguns fatores podem atenuar ou frear o movimento de queda. Pelo lado da demanda, apesar do ritmo de crescimento econômico projetado ser inferior ao dos últimos anos, ainda persiste uma elevação da renda mundial, principalmente nas economias em desenvolvimento. No âmbito da oferta ocorreram problemas climáticos na Nova Zelândia, taxas proibitivas em alguns países exportadores, como o caso da Argentina, e exaustão dos estoques públicos na União Européia. Além disso, os insumos utilizados na alimentação do rebanho continuam com preços elevados, piorando a relação de troca nos sistemas mais intensivos e podendo provocar conversão de pastagens para produção de cereais. A Figura 2 ilustra o comportamento da ração de preços entre o leite e a alimentação animal, denotando piora significativa nos últimos meses.

 

 

Figura 1: Índice mensal de preços internacionais

de produtos lácteos (média 1998-2000 = 100).

 

Figura 2: Razão de preços entre leite e milho.

 
 

Produção

A produção mundial de leite foi estimada em 676 milhões de toneladas em 2007. Para 2008, a previsão da FAO indica uma produção crescendo 2,5% para cerca de 693 milhões de toneladas (Tabela 1). Desse total, cerca de 47,5% encontra-se nas economias em desenvolvimento.

 

Tabela 1. Produção mundial de leite (milhões de toneladas em equivalente leite)

 
 

2006

2007(E)

2008 (P)

Variação   2008/2007

Produção total de leite

664,1

676,3

693,2

2,5

Leite em pó desnatado

23,4

23,7

23,8

0,6

Leite em pó integral

22,3

21,7

22,3

2,8

Manteiga

58,4

61,2

63,2

3,4

Queijo

82,5

84,3

86,3

2,3

Outros produtos

477,5

485,4

497,6

2,5

Comércio mundial

39,4

38,0

36,4

-4,3

(E) – Estimativa; (P) – Previsão
Fonte: FAO (2008)
 

Países como China, Brasil, Argentina e Uruguai, devem registrar crescimento mais acentuado da oferta, conforme Figura 3. Particularmente no caso da China, espera-se um aumento da produção de leite em 2008 mais modesto do que o registrado na década passada, de aproximadamente 20%. Caso a oferta registre alguma desaceleração nos próximos anos e a demanda continue aquecida, no longo prazo as importações podem aumentar significativamente. Vale destacar que a previsão da FAO para o crescimento da produção chinesa em 2008 é de 8,5%, devido a restrições de capacidade instalada e elevado custo de alimentação do rebanho.

 

Para o Brasil a previsão da FAO é de aumento de 8% na produção em 2008. Vale destacar que a pesquisa trimestral do leite, publicada pelo IBGE, indicou aumento de 9,3% no volume de leite adquirido sob inspeção. No caso da Argentina espera-se recuperação da oferta neste ano, após queda de 7% em 2007. No entanto, a produção projetada permanece inferior ao volume registrado em 2006. Em países como México, Ucrânia e a média da União Européia, espera-se um aumento inferior a 1%. Já na Austrália e Nova Zelândia a produção deverá apresentar declínio, devido a problemas climáticos.

 

Fonte: FGV.
Figura 3: Previsão do crescimento da produção em 2008 em países selecionados (%).
 
 

Comércio

Em 2007 as exportações mundiais de produtos lácteos recuaram para 38 milhões de toneladas, o que equivale a apenas 5,6% da produção de leite. Para 2008, a previsão é de nova queda indicando alteração na estrutura de comércio de lácteos. Esse declínio se deve especialmente a menor disponibilidade da União Européia (-11,5%) e a seca na Oceania (-10,4%). Além disso, alguns países implantaram restrições as exportações de lácteos como medida para incrementar a disponibilidade doméstica e atenuar incremento de preços. Foi o caso, por exemplo, da Argentina.

 

Por outro lado, os Estados Unidos surge como grande potencial fornecedor, devendo registrar crescimento acentuado do volume embarcado neste ano. Somente em leite em pó desnatado as exportações devem atingir cerca de 275 mil toneladas em 2008, ou 27% das exportações mundiais desse produto.
Inicialmente esperava-se um aumento das exportações mundiais, na esteira do crescimento de economias com população mais pobres como África e Ásia. No entanto, o elevado patamar de preços no passado e início de 2008 prejudicou a evolução do comércio de lácteos.

 

A demanda dos países em desenvolvimento, em termos de equivalentes litro de leite, deverá ter uma queda de 5% em 2008. Esse declínio é explicado pela redução nas compras de lácteos por importadores como Argélia, Egito, Malásia e Tailândia. Em muitos países em desenvolvimento os elevados preços internacionais foram repassados para o mercado doméstico, promovendo incremento da produção. Como resultado, deverá ocorrer alguma substituição de importações. Os produtos mais prejudicados no comércio mundial devem ser manteiga e leite em pó desnatado, segundo a FAO (Tabela 2).

 

As vendas mundiais de manteiga devem recuar 18,6% em 2008, como reflexo de retração das exportações da União Européia, com previsão de embarque de 105 mil toneladas ante 210 mil toneladas no ano passado. As exportações da Nova Zelândia também devem cair. Para o leite em pó desnatado, espera-se um declínio 4,8% nas exportações, ocasionado por retração das vendas da Nova Zelândia e União Européia. No leite em pó integral os embarques devem recuar 1,4% em função de queda prevista para a Nova Zelândia, passando de 680 mil toneladas para 612 mil toneladas. No entanto, a procura por leite em pó integral permanece relativamente aquecida, uma vez que este produto tem sido cada vez mais utilizado para reconstituição de outros produtos lácteos, como o leite fluido. No mercado de queijos, os embarques devem ficar relativamente estáveis. A União Européia continua como o maior fornecedor mundial de queijos, respondendo por 36% das exportações totais.

 

Tabela 2. Exportação de produtos lácteos (mil toneladas).

 
Produção Lácteos

2006

2007(E)

2008 (P)

Leite em pó integral

1.849

1.739

1.714

Leite em pó desnatado

1.159

1.085

1.033

Manteiga

902

865

704

Queijo

1.621

1.679

1.672

(E) – Estimativa; (P) – Previsão
Fonte: FAO (2008)
 

Em síntese, na visão da FAO, espera-se incremento da produção mundial em 2008, puxada principalmente pelos países em desenvolvimento e Estados Unidos. O crescimento da oferta global deverá ser atenuado pelo aumento nos custos de produção e problemas climáticos registrados na Oceania. A demanda ainda deve se manter aquecida, mas em ritmo menor do que o imaginado no início do ano. No âmbito dos preços, apesar de apresentarem trajetória declinante não se espera declínio muito acentuado, devido a uma combinação ainda apertada entre oferta e demanda. As cotações atuais continuam em patamar superior a média histórica e o volume de comércio deve recuar em 2008, principalmente pela menor disponibilidade de lácteos na União Européia e Oceania.

 

Agradecimentos: à Fapemig que apoia e financia esta pesquisa.

 

 

Esta é a edição nº 22 do informativo eletrônico, Panorama do Leite, de 10 de setembro de 2008, uma publicação mensal de responsabilidade do Centro de Inteligência do Leite CILeite, criado em parceria entre a Embrapa Gado de Leite e a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais – Seapa. Embrapa Gado de Leite – Chefe-geral: Duarte Vilela, Chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento: Rui da Silva Verneque, Chefe-adjunto de Comunicação e Negócios: Carlos Eugênio Martins e Chefe-adjunto de Administração: Antônio Vander Pereira. Editora Geral: Rosangela Zoccal. Coordenador de Jornalismo: Rubens Neiva. Redação: equipe técnica do CILeite. Colaboração: Vanessa Maia A. de Magalhães. Projeto gráfico: Marcella Avila. Estagiárias: Milana Zamagno, Katyelen da Silva Costa e Rafael Junqueira.

 

 

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