Análise da concentração da produção mundial
de leite entre 1992 e 2008

Glauco Carvalho - Pesquisador da Embrapa Gado de Leite
Guilherme Fonseca Travassos - Bolsista do CNPq, estudante de economia da UFJF
Lucas Campio Pinha - Bolsista do CNPq, estudante de economia da UFJF


Introdução

A produção mundial de leite de vaca foi de 578,5 milhões de toneladas em 2008, registrando crescimento anual médio de 1,4% entre 1992 e 2008 (FAO, 2010). Esse volume está distribuído por todo o mundo, mas com processos produtivos heterogêneos entre diferentes países. Países mais desenvolvidos, em geral, possuem produtividade mais elevada e maior escala de produção (CARVALHO, et al. 2007). Muitos desses países, notadamente os Europeus e os Estados Unidos contam com elevados subsídios, que tendem a apresentar tendência estrutural declinante nos últimos anos (OECD, 2005). Nos países em desenvolvimento, a produtividade também vem se elevando, provocando maior contribuição para a oferta mundial.

A pecuária de leite tem passado por transformações importantes em todo o mundo. No Brasil, a produção de leite tem apresentado um crescimento contínuo, mas o país anda não conseguiu um inserção mais agressiva no mercado internacional. É importante conhecer o mercado mundial e ficar atento às alterações em curso. O objetivo desse trabalho é analisar a concentração da produção mundial de leite por país. Além disso, espera-se identificar quais os países e regiões registraram aumento de participação na oferta global e quais foram mais prejudicados, discutindo as principais causas dessa alteração.

Para a avaliação da concentração, foi utilizado o Índice de Hirschman-Herfindahl (HHI). O Índice de Hirschman-Herfindahl é calculado a partir da soma dos quadrados da participação de cada país em relação ao tamanho total do mercado e leva em conta todos os países. Assim,

Onde
Si = fração do país na produção global
n = número de países

O valor máximo de HHI é 10.000 e ocorre quando todo o mercado é dominado por apenas um país. O valor mínimo de H é 0 indicando que o mercado é homogeneamente distribuído e tendendo a um modelo teórico de concorrência perfeita. A principal vantagem do HHI sobre o CR é que o primeiro é sensível ao número total de países e à desigualdade existente entre eles, enquanto o segundo considera apenas os maiores. As faixas de orientação da análise se baseiam em KUPFER et al (2002), sendo: i) menor que 1.000: baixa concentração; ii) 1.000 a 1.800: concentração moderada; iii) maior que 1.800: alta concentração.

Resultados e discussão

A produção de leite apresentou um crescimento anual médio de 1,4% entre 1992 e 2008, saindo de 460,7 milhões de toneladas para 578,5 milhões de toneladas. Nesse período, a Europa apresentou o maior recuo de participação na oferta global (Figura 1). A América do Norte manteve a participação estável, enquanto as outras regiões apresentaram incrementos. Merece destaque a evolução registrada pela Ásia, que subiu de 16,0% para 25,5%. Nos países da América Latina e Caribe a participação na produção passou de 9,7% para 12,9% no período analisado.

No âmbito da concentração da produção, o mercado mundial de leite apresenta indicadores de um segmento desconcentrado, fechando 2008 com o HHI de 480,60 (Figura 2). Dois momentos podem ser analisados. O primeiro vai até 2004, período em que a produção de leite se elevou e a concentração produtiva diminuiu. Após 2004 tanto a produção quanto a concentração registraram incremento, ainda assim, quando se analisa todo o período verifica-se recuo na concentração. Esse movimento ocorreu principalmente pela expansão da oferta de alguns países asiáticos e perda de posição de países Europeus, anteriormente listados entre os grandes produtores. Ou seja, por este indicador os países de menor expressão na produção mundial de leite ganharam espaço no cenário mundial.

Os países europeus foram os que mais perderam participação de mercado. A Ucrânia foi o país que mais contribuiu para essa queda, com produção recuando de 18,96 milhões de toneladas em 1992 para 11,52 milhões de toneladas em 2008 (Tabela 1). O mesmo movimento ocorreu na Rússia, que também contribuiu para a perda de participação européia na oferta mundial. Com o fim da antiga União Soviética, esses países passaram por um processo de reorganização, mas com grandes dificuldades competitivas.

Por outro lado, a Ásia vem sistematicamente aumentando sua participação na produção mundial de leite. Entre 1992 e 2008 a produção asiática dobrou, graças principalmente à expansão verificada na China e na Índia. Em 1996 a China era o vigésimo produtor mundial de leite de vaca, chegando à terceira posição em 2008. Nesse período, ocorreram grandes investimentos no setor com importação de vacas da Nova Zelândia e Austrália, transferência de embriões e melhorias no manejo (WEIMIN, 2007). No caso da Índia, também se pode verificar um importante aumento de produtividade do rebanho, na esteira dos investimentos em melhoramento genético.

Conclusão

A produção de leite de vaca está distribuída por todo o mundo. O crescimento histórico da produção é de aproximadamente 1,4% ao ano e os países em desenvolvimento vem ganhando participação frente aos desenvolvidos. Os países asiáticos foram os que mais aumentaram participação na oferta, sobretudo China e Índia. Por outro lado, o continente Europeu vem perdendo participação de mercado com destaque para os países da parte oriental como Rússia e Ucrânia.

No âmbito da concentração produtiva, a oferta de leite é bastante desconcentrada. Além disso, verificou-se uma tendência de desconcentração entre 1992 e 2004, registrando aumento em seguida. O principal produtor mundial detém cerca de 14,9% da oferta global. Já os cinco maiores detêm 39,2% e os dez maiores 55,4%. Por fim, apesar de o mercado de lácteos apresentar-se desconcentrado, movimentos de alteração na oferta foram encontrados e novos atores surgiram, ocupando espaços de importantes produtores como os Europeus. Por enquanto, os países que mais se aproveitaram disso foram os asiáticos. Esse é um movimento que não deve cessar, ou seja, países com maior competitividade, possibilidades de incorporação de tecnologia e estratégia definidas de inserção de mercado vão aproveitar melhor os espaços no ambiente competitivo global.

Referências bibliográficas

CARVALHO, G.R., YAMAGUCHI, L.. C. T., COSTA, C. N., HOTT, M. C. Leite: Análise de produtividade. Revista Agroanalysis, vol. 27, n. 09, setembro de 2007. p. 19 – 21;

FAO - FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS. FAOSTAT database, 2010. Disponível em . Acesso em: 27 janeiro 2010.

KUPFER, D. HASENCLEVER, L. Economia Industrial: fundamentos teóricos e práticos no Brasil. Rio de Janeiro: Campus, 2002.

MARTINS, P. C. O futuro é leite em excesso. Piracicaba. Portal Milkpoint. Jan. 2007. Disponível em: ;

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT (OECD). Agricultural policies in oecd countries: monitoring and evaluation 2005. 2005. Disponível em .

WEIMIN, Y. China – rapid development of Inner Mongolia's Dairy Sector. In HEMME et al.: IFCN Dairy Report 2007, International Farm Comparison Network, IFCN Dairy Report Center, Kiel, Germany, 2007. 214 p.

 

Esta é a edição nº 42 do informativo eletrônico, Panorama do Leite, de 19 de maio de 2010, uma publicação mensal de responsabilidade do Centro de Inteligência do Leite CILeite, criado em parceria entre a Embrapa Gado de Leite e a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais – Seapa. Embrapa Gado de Leite – Chefe-geral: Duarte Vilela, Chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento: Rui da Silva Verneque, Chefe-adjunto de Comunicação e Negócios: Elizabeth Nogueira Fernandes e Chefe-adjunto de Administração: Antônio Vander Pereira. Editores: Kennya Beatriz Siqueira e Marcos Cicarini Hott. Coordenador de Jornalismo: Rubens Neiva. Redação: equipe técnica do CILeite. Colaboração: Pedro Gomide e Leonardo Gravina. Projeto gráfico: Marcella Avila.

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