O componente florestal em sistemas silvipastoris como alternativa para agregação de renda em propriedades leiteiras na Zona da Mata, MG

Marcelo Dias Müller - muller@cnpgl.embrapa.br
Carlos Renato Tavares Castro - castro@cnpgl.embrapa.br
Domingos Sávio Campos Paciullo - domingos@cnpgl.embrapa.br
Elizabeth Nogueira Fernandes - nogueira@cnpgl.embrapa.br


Com o crescimento populacional, a urbanização e o aumento da renda, principalmente, nos países em desenvolvimento, estima-se que a demanda por produtos agropecuários e florestais aumente consideravelmente até o ano de 2020. A pecuária deverá responder por mais da metade do total do valor da produção agrícola mundial em 2030. Da mesma forma, o consumo mundial de madeira apresenta uma tendência de crescimento que deverá alcançar um aumento de 60% em relação ao atual (FAO, 2002).

Soares et al. (2003) enfatizam que essa tendência vem acompanhada de uma mudança no foco da demanda por madeira: o setor industrial de base florestal tem preterido a utilização de madeira de origem nativa por madeira de origem reflorestada.

A par dessas considerações, vale ressaltar que ambas as atividades são marcadas por uma série de impactos ambientais históricos que geraram, e ainda geram, muitas discussões e controvérsias entre os seus praticantes e movimentos ambientalistas.

No Brasil, a maior parte dos sistemas de produção pecuária se baseia na utilização de pastagens constituídas de monoculturas de gramíneas melhoradas, principalmente por espécies do gênero Brachiaria, com destaque para B. decumbens B. brizantha cv. Marandu (Pereira et al., 2005). Historicamente, estas pastagens foram estabelecidas em solos de baixa fertilidade natural que, em poucos anos de uso, começavam a apresentar sinais de degradação. Com isso, o que vem se observando é um quadro de redução da produção de forragem, comprometimento da produção animal, aumento dos custos de produção e degradação ambiental. Assim, o avanço do processo de degradação das pastagens tem se firmado como um dos principais entraves à sustentabilidade dos sistemas de produção animal a pasto.

As principais causas de degradação dessas pastagens são: falhas no estabelecimento, uso de taxas de lotação acima da capacidade de suporte do pasto, levando à condição de superpastejo, falta de adubação de reposição dos nutrientes e declínio na fertilidade do solo, evidenciado pela deficiência de nitrogênio e outros nutrientes, realização de queimadas sucessivas e ataque de insetos-praga e patógenos (Boddey et al., 2004).

Na região sudeste, as áreas de influência da Mata Atlântica, particularmente a Zona da Mata Mineira, são caracterizadas por apresentar relevo bastante acidentado e solos com elevada acidez e baixa fertilidade natural (Carvalho et al., 2001). Paralelamente a isto, grande parte destas áreas é ocupada por pastagens, geralmente degradadas.

Os sistemas agrossilvipastoris, ganham especial destaque como alternativa de uso sustentável do solo, na medida em que proporcionam: i) proteção do solo contra a erosão, conservação da água, manutenção do ciclo hidrológico e melhoramento das características físicas e químicas do solo (Macedo, 2000; Xavier et al., 2002; Alvim et al., 2004), ii) aumentos do valor nutricional da forragem (Castro et al, 1999; Paciullo et al., 2007a) e do conforto térmico animal (Paes Leme, et al., 2005; Pires et al., 2008), iii) melhorias no desempenho de bovinos criados a pasto (Paciullo et al., 2007b) e, iv) benefícios sócio-econômicos tais como diversificação da produção e da renda e redução da sazonalidade da demanda por mão-de-obra no campo (Macedo, 2000), o que torna a atividade pecuária regional mais sustentável e rentável (Franco, 2000).

Estes sistemas caracterizam-se pela integração de árvores, espécies forrageiras e o gado, de forma simultânea ou escalonada no tempo. Tais sistemas representam uma forma de uso da terra onde as atividades silviculturais e pecuárias são combinadas com o objetivo de gerar produção de forma complementar pela interação dos seus componentes.

Neste sentido, foi realizada uma análise econômica de um modelo de sistema agrossilvipastoril com o objetivo de comparar alternativas de uso do componente florestal como forma de agregação de renda em propriedades leiteiras da Zona da Mata de Minas Gerais. Foram estudadas três alternativas: venda da madeira em pé (forma mais usual de comercialização); venda da madeira empilhada na propriedade e venda da madeira entregue na fábrica.

Pela análise econômica realizada determinou-se que a uma taxa de desconto de 6% tanto o VPL quanto a TIR, apontam todas as três alternativas como viáveis. Os indicadores econômicos utilizados apresentaram valores crescentes com a agregação de valor ao produto florestal (alternativa 1: VPL = R$ 1.152,00 e TIR = 10%; alternativa 2: VPL = R$ 1.453,00 e TIR = 11% e; alternativa 3: VPL = R$ 1.745,00 e TIR = 12%).

As simulações de mudanças nos preços dos produtos do sistema agroflorestal mostraram que, no caso de venda de madeira em pé, o preço do kg de carne poderia sofrer uma queda de 25% (sendo vendido a R$ 1,72/kg). No caso da venda da madeira empilhada na estrada a queda no preço do kg de carne poderia ser de 33% (sendo vendido a R$ 1,55/kg), e no caso da venda da madeira entregue no pátio do consumidor a queda no preço da carne deveria ser de 39% (sendo vendida a R$ 1,41/kg) para que houvesse equilíbrio entre as receitas e os custos.

Por outro lado, considerando-se o preço da carne constante, a queda nos preços da madeira em pé, empilhada na estrada e entregue no pátio do consumidor deveria ser de 56%, 57% e 59%, respectivamente, para que o VPL se aproxime de 0.

Com estes resultados, pode-se inferir que a adoção de sistemas agrossilvipastoris, proporciona maior sustentabilidade à pecuária leiteira por promover, além dos benefícios ambientais, a geração de renda adicional e, principalmente, diminuição do risco da atividade por ser mais tolerante a variações nos preços de produtos agropecuários.

 

Referências Bibliográficas

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BODDEY, R. M.; MACEDO, R.; TARRÉ, R. M.; FERREIRA, E.; OLIVEIRA, O. C.; REZENDE, C. P.; CANTARUTTI, R. B.; PEREIRA, J. M.; ALVES, B. J. R.; URQUIAGA, S. Nitrogen cycling in Brachiaria pastures: the key to understanding the process of pasture decline. Agriculture Ecosystems and Environment, v. 103, p. 389-403, 2004.

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Esta é a edição nº 32 do informativo eletrônico, Panorama do Leite, de 28 de julho de 2009, uma publicação mensal de responsabilidade do Centro de Inteligência do Leite CILeite, criado em parceria entre a Embrapa Gado de Leite e a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais – Seapa. Embrapa Gado de Leite – Chefe-geral: Duarte Vilela, Chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento: Rui da Silva Verneque, Chefe-adjunto de Comunicação e Negócios: Carlos Eugênio Martins e Chefe-adjunto de Administração: Antônio Vander Pereira. Editores: Rosangela Zoccal e Glauco Carvalho. Coordenador de Jornalismo: Rubens Neiva. Redação: equipe técnica do CILeite. Colaboração: Pedro Gomide e Leonardo Gravina. Projeto gráfico: Marcella Avila.

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