Identificando fontes e causas de alta contagem bacteriana total do leite do tanque

Maria Aparecida Vasconcelos Paiva e Brito
Pesquisadora da Embrapa Gado de Leite - mavpaiva@cnpgl.embrapa.br


A contagem bacteriana total do leite cru (CBT) é o teste empregado para avaliação da qualidade microbiológica do leite. O resultado fornece indicação dos cuidados de higiene empregados na obtenção e no manuseio do leite na fazenda. Altas contagens indicam falhas na limpeza dos equipamentos, na higiene da ordenha e/ou problemas na refrigeração do leite. A CBT é um requerimento adotado em diversos países e usado para bonificação em programas de pagamento pela qualidade. O resultado é dado em ufc/ml (unidades formadoras de colônias por mililitro de leite).

Os principais microrganismos que contaminam o leite são as bactérias. Os vírus, fungos e leveduras têm participação reduzida, embora sejam importantes em determinadas situações. Quando se analisa o conjunto dos microrganismos que compõem a contagem bacteriana total, observa-se que eles podem ser divididos em grupos distintos:

Microrganismos psicrotróficos: Ocorrem principalmente no solo e na água e se multiplicam na temperatura de refrigeração do leite (=7oC). Altas contagens de microrganismos psicrotróficos no leite estão associadas a deficiências na higiene da ordenha, falhas na limpeza e higienização do tanque e dos equipamentos de ordenha, refrigeração inadequada do leite, ou estocagem do leite refrigerado por mais de 48 horas na fazenda. Quando as condições de higiene da produção de leite são ruins, estas podem corresponder a 75% ou mais do total da CBT.

Microrganismos termodúricos: São microrganismos que sobrevivem à temperatura de pasteurização (63oC por 30 minutos ou 72oC por 15 segundos). Alta contagem de bactérias termodúricas está associada com deficiências crônicas ou persistentes de limpeza dos equipamentos de ordenha, ou de tetos sujos com lama ou outras sujeiras do solo. Indica também possibilidade de rachadura nos componentes de borracha ou presença de depósitos chamados de pedras de leite nas tubulações dos equipamentos de ordenha. Como esses microrganismos sobrevivem à pasteurização, podem causar problemas na vida de prateleira do leite, principalmente se as bactérias termodúricas forem também psicrotróficas. Nos Estados Unidos, aproximadamente 25% dos problemas relacionados com a vida de prateleira do leite pasteurizado e de produtos lácteos cremosos ocorrem devido à ação deletéria de bactérias psicrotróficas termodúricas.

Coliformes: São microrganismos encontrados nos dejetos dos animais, solo, águas contaminadas, ou vegetais. A contagem de coliformes reflete as práticas de limpeza e higiene empregadas na fazenda. Contagens acima de 50 ufc/ml sugerem práticas deficientes de ordenha, problemas na limpeza dos equipamentos, ou água contaminada.

Apesar de a CBT ser um método padronizado e que permite obter resultados confiáveis, não permite identificar os diferentes grupos de microrganismos presentes na amostra. Um conjunto de testes tem sido empregado para monitorar o leite do tanque em alguns países. Estes testes constituem uma maneira de “desdobrar” o resultado único dado pela contagem bacteriana total, e permitem indicar a origem e as causas da contaminação bacteriana do leite cru. Além da CBT, avaliam-se a contagem de bactérias psicrotróficas, de termodúricas e de coliformes.

O teste para a contagem total de bactérias psicrotróficas requer a incubação a 7oC durante 10 dias. Mas, uma estimativa do número destes microrganismos pode ser feita incubando-se a amostra de leite na temperatura de 13oC por 18 horas e fazendo nova contagem, usando o mesmo procedimento empregado para a contagem bacteriana total. Esse teste é chamado de Preliminary incubation count (PIC). Um aumento de três a quatro vezes na contagem em relação à CBT, indica falhas na higiene da ordenha ou problemas relacionados à limpeza e higienização dos equipamentos e do tanque de refrigeração.

Os microrganismos termodúricos podem ser avaliados pela contagem total de bactérias depois de aquecer a amostra a 63oC durante 30 minutos. Essa análise é chamada de Lab pasteurized count (LPC). Na Tabela 2 são apresentados exemplos de análises microbiológicas do leite total de quatro rebanhos para esses grupos de bactérias. Na terceira coluna está a interpretação dos resultados, considerando os grupos de microrganismos presentes. Como pode ser observado a baixa CBT do rebanho 3 (23.000 ufc/ml), poderia ser reduzida ainda mais, pois as principais bactérias são termodúricas e provavelmente provenientes de sujeiras nos equipamentos de ordenha.

A interpretação dos resultados dos testes microbiológicos para avaliação da qualidade do leite total do rebanho deve ser analisada juntamente com o resultado da CBT. Dessa maneira poderão ser obtidas informações mais precisas sobre as condições sanitárias da produção e serão identificados problemas de higiene que não são normalmente detectados somente com a CBT. Para a melhor avaliação da qualidade do leite do rebanho, devem-se juntar às análises microbiológicas os resultados da contagem de células somáticas (CCS) e da composição (teores de proteína e gordura). Dessa forma as informações obtidas auxiliarão no gerenciamento da qualidade do leite do rebanho.

 

Referências

BRITO, M. A. V. P.; BRITO, J. R. F.; PORTUGAL, J. A. B. Identificação de contaminantes bacterianos no leite cru de tanques de refrigeração. Revista do Instituto de Laticínios Cândido Tostes, v. 57, n. 327, p. 83-88, 2002.

MURPHY, S. C. Raw milk bacteria tests: standard plate counts, preliminary incubation counts, lab pasteurized count and coliform count. What do they mean for your farm? In: NATIONAL MASTITIS COUNCIL REGIONAL MEETING, 1997, Syracuse. Proceedings… Syracuse, 1997. p. 34-42.

NATIONAL MASTITIS COUNCIL. Microbiological Procedures for the Diagnosis of bovine udder infection and determination of Milk quality. 4. ed. Verona, 2004. 47p.

WEHR, H. M.; FRANK, J. F. Standard methods for the examination of dairy products. 17. ed. Washington, DC: American Public Health Association, 2004. 570 p.

 

Esta é a edição nº 40 do informativo eletrônico, Panorama do Leite, de 19 de março de 2010, uma publicação mensal de responsabilidade do Centro de Inteligência do Leite CILeite, criado em parceria entre a Embrapa Gado de Leite e a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais – Seapa. Embrapa Gado de Leite – Chefe-geral: Duarte Vilela, Chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento: Rui da Silva Verneque, Chefe-adjunto de Comunicação e Negócios: Elizabeth Nogueira Fernandes e Chefe-adjunto de Administração: Antônio Vander Pereira. Editores: Rosangela Zoccal e Glauco Carvalho. Coordenador de Jornalismo: Rubens Neiva. Redação: equipe técnica do CILeite. Colaboração: Pedro Gomide e Leonardo Gravina. Projeto gráfico: Marcella Avila.

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