|
A importância do ordenhador para a produção de leite de qualidade Letícia Caldas Mendonça |
Dentre estas tarefas e fatores citados, muitos necessitam de investimentos financeiros para se adequarem à produção de leite com qualidade. Dependendo do momento econômico em que o país se encontra, estes podem ser mais fáceis ou difíceis de serem corrigidos. Mas existe um fator, de essencial importância para a produção de leite de qualidade, que pouco depende de investimento financeiro; depende muito mais de boa vontade, incentivo e pró-atividade. É a qualificação e motivação da mão de obra que trabalha diretamente na ordenha. Em simples palavras: a capacitação do ordenhador. Qual é o papel do ordenhador na produção de leite de qualidade? É ele quem obtém, de forma direta, o principal produto de uma propriedade leiteira. É este colaborador que está em contato direto com o leite e de cujo trabalho depende todo o resultado dos esforços realizados por uma ou várias pessoas numa pequena, média ou grande propriedade leiteira. Todas aquelas tarefas e fatores citados acima fazem parte, direta ou indiretamente, da função do ordenhador. Por isso, a execução das atividades de ordenhador, pode, positiva ou negativamente, afetar enormemente a qualidade do leite produzido. Muitos estudos mostram a importância da relação ordenhador-vaca na produção de leite de qualidade. Por exemplo, um destes estudos relatou que a presença durante a ordenha, de funcionários agressivos, aumenta em 70% o volume de leite residual, um dos fatores de risco para ocorrência de mastite; e que as vacas sob influência desses funcionários defecam seis vezes mais durante a ordenha do que vacas sob influência de ordenhadores calmos e gentis (Seabrook, 1994 e Breuer et al., 2000). Uma pesquisa recente relatou que em propriedades leiteiras nas quais a rotina de ordenha está descrita e ocorre treinamento frequente de seus funcionários, o número de vacas ordenhadas por hora por ordenhador é maior e a taxa de mastite clínica é menor, como mostra a tabela 1.
![]()
A qualificação do ordenhador, portanto, é fundamental na produção de leite de qualidade. O ordenhador deve conhecer as metas a serem atingidas, em que lugar do processo ele se localiza na obtenção destes resultados e saber realizar suas atividades corretamente. Saber realizar significa não somente executar a parte operacional, mas compreender também o porquê de cada etapa do processo. Quanto maior for o seu entendimento do motivo e da importância de cada tarefa que ele executa, maiores serão as chances de que elas sejam realizadas corretamente. Por exemplo, se ele souber que deve realizar o teste da caneca telada em todos os tetos, em todas as vacas, em todas as ordenhas do dia, ele poderá realizar facilmente tal tarefa. Mas se ele estiver consciente de que aquela prática de retirar três jatos de leite de cada teto antes da ordenha facilita o diagnóstico precoce da mastite clínica, elimina os jatos de leite mais contaminados, auxilia no estímulo à descida do leite e ainda evita que o leite das vacas com mastite clínica, que possui alta CCS, seja colocado junto ao leite das vacas sadias, com toda certeza ele não esquecerá de realizar tal tarefa com zelo e responsabilidade. Em muitas ocasiões, o ordenhador não é responsável somente pelo ato mecânico da ordenha, mas também deve zelar pela saúde dos animais, na detecção de mastite clínica, no tratamento de doenças, na aplicação de vacinas, etc.; ele se torna o braço direito do veterinário. Por isso, o treinamento é fundamental para gerar funcionários bem informados, que saberão corretamente o que fazer no momento oportuno. O treinamento e o conhecimento proporcionam autonomia e segurança nas importantes e urgentes tomadas de decisão que surgem a todo tempo. Quantas vezes e em quantas diversas situações escutamos produtores de leite dizendo: “trabalhar com peão não dá!” ou “mão de obra é o meu maior problema aqui na fazenda!”? Enquanto estes rótulos são criados e mantidos, a distância entre o real e o possível é cada vez maior; e os paradigmas, cada vez mais enraizados. A maioria desses funcionários não são assim, eles estão assim. Principalmente pela falta de alguém (no caso, o proprietário, o gerente, o veterinário, o técnico responsável) capaz de promover a modificação do ambiente, das pessoas e da cultura em geral. A verdade é que ninguém nasce sabendo exatamente o que deve ser feito. É necessário que alguém os ensine a fazer. Como e porquê. A capacitação do ordenhador quanto às práticas para produção de leite de qualidade pode ser realizada periodicamente, de acordo com a necessidade de cada propriedade e sempre que houver um funcionário novo naquela função. Não são necessárias grandes ou novas tecnologias para este treinamento. Ele pode ser feito no escritório, dentro do fosso, na sala de ordenha, utilizando computador ou quadro negro, não importa. O fundamental é que todos estejam envolvidos e cientes da relevância das informações que estão sendo passadas ali. Quando pensamos nas atividades que devem ser realizadas rotineiramente numa propriedade leiteira, várias funções nos vêem à cabeça: dirigir o trator, cuidar das bezerras, picar a cana, buscar a silagem, tratar as vacas de leite e o gado solteiro, limpar as camas das vacas, os cochos de alimentação, os bebedouros, limpar o curral, consertar uma cerca, vacinar o gado contra a aftosa. Todas essas funções exigem conhecimento e experiência e devem ser realizados de forma contínua. Quando se trata da ordenha, realizada uma, duas ou três vezes ao dia, esta não pode, em hipótese alguma, deixar de ser feita. Faça chuva ou faça sol, seja Natal, réveillon ou feriado. Não há como deixar de ordenhar as vacas, mesmo em condições bastante adversas, como por exemplo, quando há falta de energia elétrica em uma propriedade cuja ordenha seja mecânica. Assim, o trabalho do ordenhador é bastante rotineiro; sua função se repete em toda ordenha, durante todos os dias do ano, sem exceção. E este é um fato que, se não for levado em consideração, pode desencadear situações de estresse, esgotamento físico e mental e até mesmo em pedidos de demissão. Por isso, quando falamos em motivação do ordenhador, estamos falando em mostrar claramente para este trabalhador quão vital é a sua função para o sucesso do negócio. E reconhecê-lo por isso. Seja na forma de bonificação financeira ou por meio de prêmios, placas, elogios. Em inúmeras situações, não é somente a remuneração que garante a satisfação do empregado; ser reconhecido por aquilo que faz, com a competência que exerce, muitas vezes, é o maior prêmio para um homem. Quando o ordenhador aprende a função, ele gosta do que faz, discute, traz novas idéias e conceitos sobre o que é melhor ou mais adequado. A capacitação de ordenhadores serve justamente para isso, abrir este diálogo entre funcionário, veterinário e produtor, encontrando a melhor forma de solucionar os problemas. Quando o ordenhador aprende, ele é pró-ativo, criativo, questiona, discute e inova. Saber que seu trabalho pode interferir enormemente nos resultados finais do negócio instiga seu interesse diante dos desafios. É neste diálogo aberto que entra a motivação. O ordenhador se sente útil, fica feliz e motivado sabendo que faz parte daquilo, que não está apenas cumprindo ordens, ele mesmo ajudou a fazer, participou da melhoria dos resultados. Foi o trabalho dele que possibilitou o sucesso. O envolvimento das pessoas com o negócio permite o diálogo, a reflexão e estimula a vontade de fazer bem feito, de se atingir as metas e os resultados. Um bom ordenhador pode ser formado de duas maneiras: contratando uma pessoa “pronta”, com boas indicações e valores individuais ou formando esta pessoa, dando valor aos princípios morais e à vontade de aprender, investindo na sua capacitação pessoal e profissional. A primeira opção é a mais simples, mas a segunda é a mais sustentável. A mente das pessoas é um canteiro fértil para proliferação de ideias, conceitos e valores; sua formação dependerá do que foi plantado. "Trate as pessoas como se elas fossem o que poderiam ser e as ajudará a se tornarem aquilo que são capazes de ser" Referência: - BREUER, K.; HEMSWORTH, P.; BARNETT, J. et al. Behavioural response to humans and the productivity of commercial dairy cows. Applied Animal Behaviour Science, v.66, n.4, p.273-288, 2000. |
Esta é a edição nº 31 do informativo eletrônico, Panorama do Leite, de 29 de junho de 2009, uma publicação mensal de responsabilidade do Centro de Inteligência do Leite CILeite, criado em parceria entre a Embrapa Gado de Leite e a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais – Seapa. Embrapa Gado de Leite – Chefe-geral: Duarte Vilela, Chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento: Rui da Silva Verneque, Chefe-adjunto de Comunicação e Negócios: Carlos Eugênio Martins e Chefe-adjunto de Administração: Antônio Vander Pereira. Editora Geral: Rosangela Zoccal. Coordenador de Jornalismo: Rubens Neiva. Redação: equipe técnica do CILeite. Colaboração: Pedro Gomide e Leonardo Gravina. Projeto gráfico: Marcella Avila. |
Para não receber mais este newsletter do Centro de Inteligência do Leite. Clique aqui |