A INFLUÊNCIA DA UNIÃO EUROPÉIA NA ELEVAÇÃO DO PREÇO INTERNACIONAL DE LÁCTEOS


Paulo do Carmo Martins – Economista Ph.D., Chefe-geral da Embrapa Gado de Leite e Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora – pmartins@cnpgl.embrapa.br

 

Apresenta uma analise da influência da Europa na elevação do preço do leite no mercado internacional, considerando o fato que este bloco de países responde por cerca de 1/3 dos produtos transacionados entre nações.

 

Até os países europeus que ganharam a II Grande Guerra estavam destruídos quando a Guerra terminou. Como mecanismo de soerguimento, França, Bélgica, Holanda, Alemanha Ocidental e Luxemburgo, em 1958, assinaram um acordo de livre-comércio em torno do carvão, então importante fonte energética. E, logo, fizeram o mesmo em torno de alimentos, com a idéia de assegurar que suas populações não passariam fome nunca mais. Para isso, criaram a Política Agrícola Comum que visava garantir estímulos fortes à produção de alimentos, daí o protecionismo. Portanto, na origem da UE está o setor agrícola.

 

Em 1973, a Irlanda, o Reino Unido e a Dinamarca entraram para o Bloco, criando a UE–09. Em 1981, a Grécia aderiu ao Bloco e, em 1986, aderiram Portugal e Espanha, criando a UE–12. Em 1995, a UE contava 15 países, com a entrada de mais três: Suécia, Finlândia e Áustria (UE–15). Mas, momento radical, mesmo, ocorreu em 2.004. No início daquele ano foram incorporados os seguintes países: Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia, República Tcheca, Eslováquia, Hungria, Eslovênia, Malta e Chipre, formando a UE–25. Em 2.007, Romênia e Bulgária foram aceitas e a UE passou a ter 27 membros. Como o que queremos entender é o efeito da UE nos preços do leite, que começaram a subir em 2.006, então fiquemos com a UE – 25.

 

Comecemos a análise pelo lado da oferta. Entre 2.002 e 2.005 o rebanho de vacas caiu em 6,1%, enquanto que a produtividade por vaca cresceu 7,7%. O fato é que a produção caiu de 143.224 mil toneladas para 142.850 mil toneladas no período. Por outro lado, a entrada dos dez novos países não mudou substancialmente o “ranking” de produção na União Européia. Somente a Polônia se destacou, ocupando a sétima posição em 2005. Os demais nove países ficaram nas últimas colocações e responderam por, no máximo 1,8% do total, o que é o caso da República Tcheca. Os demais países são inexpressivos. Quanto ao processamento, a produção de leite em Pó desnatado caiu 23,1% em três anos. Muito, não? Pois algo similar aconteceu com leite em Pó integral, Creme e outros, cuja produção caiu 23,2%. Já a produção de Manteiga e Queijo teve queda menor, de 7,1% e o Condensado de 7,3%.

 

Os dados até o presente demonstram que houve redução de oferta de derivados lácteos por parte da UE e que os dez novos países pouco acrescentaram em termos de produção para a UE-25. Vejamos, agora, se houve mudança na demanda. Para isso, é importante analisar inicialmente alguns indicadores econômicos. Na comparação entre os quinze países que compunham a UE e os dez recém-incorporados praticamente não ocorre crescimento populacional. Na UE-15 a média de 0,3% ao ano e nos dez países a média é de -0,03 ao ano. A renda per capita na UE–15 é US$ 34,3 mil e nos dez países é de US$ 19,1 mil, ou pouco mais da metade. Já a inflação tem médias anuais baixas nos dois grupos escolhidos para comparação, ou seja, 2,3% na UE–15 e 3,5% nos dez novos, enquanto que o investimento é percentualmente maior no segundo grupo. No grupo UE–15, o destaque é a Irlanda com uma taxa de investimentos muito elevada, em patamares parecidos com os dez países novos. Em síntese, houve uma incorporação de países com menor renda per capita, com população que não cresce e com ótimos indicadores de solidez econômica, pois a inflação é baixa e o investimento é maior que a parte rica da UE. Portanto, esses novos países têm condições de elevar o consumo de lácteos.

 

Quando há crescimento de renda em países em desenvolvimento, cresce o consumo de leite. É necessário, então, verificar se esses novos países têm apresentado crescimento contínuo da renda. E o resultado apresentado na Tabela 1 é surpreendente. Entre 1999 e 2006 a Letônia, a Estônia e a Eslováquia cresceram a renda a taxas que lembram a China, nos últimos três anos. Para comparar, entre 1980  e  2006, ou  em  27

 anos, a economia do Brasil cresceu 73%. Já a Estônia e a Letônia cresceram mais de 94% em apenas oito anos... Os demais países listados também tiveram desempenhos muito favoráveis, acima do crescimento mundial. E mesmo a Irlanda, conhecida por sua pobreza, está ficando rapidamente rica. Vale lembrar que estes países praticamente não têm crescimento da população, ao contrário do Brasil. Logo, quando a renda cresce, cresce em igual magnitude a renda per capita. Portanto, cresce vigorosamente o poder de consumo.

 

Conhecendo o passado de pobreza desses dez novos países da UE e tomando conhecimento do crescimento veloz de suas rendas nacionais cabe, então, buscar informações sobre o consumo per capita de leite nesses países. Infelizmente, os dados oficiais disponíveis retratam somente os países que compõem a EU-15 e não os novos. Mas, é de se supor que tenha ocorrido forte crescimento do consumo no âmbito da nova UE, com as novas incorporações, pois, em 2004 os estoques comunitários de Manteiga da UE-25 era de 254,5 mil toneladas. Em 2005 os estoques caíram para 162,6 mil. Em 2006 caíram ainda mais, para 122,4 mil. A situação foi mais radical para o Leite desnatado. Em 2004 os estoques comunitários eram de 182 mil toneladas. Em 2005 caíram para 42,9 mil. Já em 2006, quando começa a ascensão dos preços internacionais, os estoques comunitários foram de, simplesmente, zero!

 

Vamos analisar uma última variável, ou seja, a atuação da União Européia no mercado externo. A Tabela 2 reproduz dados deste Bloco e o Restante do Mundo, entre os anos de 1999 e 2005. O volume de Leite em Pó desnatado caiu entre 2003 e 2005. Mas, proporcionalmente, a queda foi menor na UE-25. Na série de dados de sete anos apresentada a UE-25 foi responsável, em média, por 20,8% das exportações mundiais. Todavia, em 2005 foi de 21,5%. Para Pó Integral a média foi de 32,0%, mas em 2005 foi 35,4%. Também as exportações de Queijo foram relativamente maiores em 2005, quando se compara com o resto do Mundo. Naquele ano a UE-25 exportou 46,2% do total mundial, quando a média da série foi de 33,8%. Por fim, a participação mundial nas exportações de Condensado, em média, foi de 44,4%, enquanto que em 2005 foi de 55,7%.

 

Em síntese, a entrada de mais dez países na União Européia não aumentou significativamente a oferta de leite naquele Bloco, mas o consumo de leite dentro do Bloco cresceu significativamente, pois a renda per capita do conjunto dos 25 países cresceu 54% em dez anos, fruto do expressivo crescimento econômico ocorrido nos países mais pobres, ou seja, os dez novos países. Portanto, a capacidade de consumir leite cresceu significativamente no Bloco. Ademais, o processamento de leite caiu no Bloco nos últimos anos, embora a participação relativa do Bloco no mercado internacional tenha aumentado. Tudo isso levou a uma redução muito forte dos estoques comunitários a partir de 2004.


 

Além disso, é possível que esteja em curso uma reposição da União Européia no mercado internacional, ao reduzir a produção de Leite em Pó e ao se fixar na comercialização de produtos de maior valor agregado, como queijos. Se assim for, é possível que a retirada de subsídios para esta modalidade de leite tenha vindo para ficar, o que é bom para o Brasil, que tem competitividade na exportação de commodities.

 

 

Esta é a edição nº 10, do informativo eletrônico, Panorama do Leite de 03 de Setembro de 2007,  uma publicação mensal de responsabilidade do Centro de Inteligência do Leite CILeite, criado em parceria entre a Embrapa Gado de Leite e a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais Seapa. Embrapa Gado de Leite Chefe-geral: Paulo do Carmo Martins, Chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento: Pedro Braga Arcuri, Chefe-adjunto de Comunicação e Negócios: Marne Sidney de Paula Moreira e Chefe-adjunto de Administração: Luiz Fernando Portugal Silva. Editora Geral:Rosangela Zoccal. Coordenador de Jornalismo: Rubens Neiva. Redação: equipe técnica do CILeite. Estagiária: Lidiane Medeiros Santos. Colaboração: Vanessa Maia A. de Magalhães  Projeto Gráfico: Marcella Avila. Editoração eletrônica: Leonardo Fonseca. Estagiário: Rafael Junqueira.

 

 

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